terça-feira, 31 de dezembro de 2024

Analisando a Psicologia Transpessoal

por Herley Leite de Paula e Silva

Introdução

A Psicologia Transpessoal tem como um dos seus principais pesquisadores, Stanislav Grof, psiquiatra norte-americano, nascido em 1931, em Praga, na antiga Tchecoslováquia. Neste artigo, vou utilizar o trabalho de Grof para nos ajudar a entender a Psicologia Transpessoal.

Acredito que houve uma boa influência de Jung na obra de Grof e ele também influenciou e foi influenciado por Abraham Maslow e Ken Wilber. Seus trabalhos são um importante subsídio para os místicos, espiritualistas e estudiosos da Psicologia em geral.

Neste artigo vamos tratar de alguns conceitos da Psicologia Transpessoal, de acordo com a interpretação de Grof, como os modos de consciência hilotrópico e holotrópico, os níveis da consciência, a identificação com outras pessoas, a consciência grupal, a identificação com animais, as experiências ancestrais, as experiências de vidas passadas, as experiências espíritas, a unidade com a matéria, a unidade com toda a vida, a identificação com o planeta Terra, a identificação com o universo físico e a identificação com a Consciência Cósmica.

O modo de consciência hilotrópico

Na consciência existe o modo hilotrópico e o modo holotrópico. No modo de consciência hilotrópico, vivenciamos uma individualidade física consolidada, com limites bem estabelecidos. Os objetos físicos são percebidos como separados. Vivenciamos um espaço com três dimensões espaciais e uma de tempo. O próprio tempo passa pelo passado, presente e futuro, em linha reta. O mundo é regido pela causalidade ascendente. Só se pode estar em um lugar de cada vez. A matéria tem uma consistência sólida e o universo opera pela física newtoniana (Grof, 1997, p. 223, 224).

O modo de consciência holotrópico

No modo de consciência holotrópico, ou da consciência transpessoal, a matéria sólida não passa de uma ilusão. Podemos sempre ter acesso ao passado e ao futuro. Nessa realidade, um objeto pode estar em dois lugares ao mesmo tempo, pois esse modo opera pela física quântica.

No modo holotrópico experimentamos fenômenos paranormais como a telepatia e a clarividência e temos acesso à memória do inconsciente coletivo. É possível ter a experiência da identificação com o universo e também visitar o domínio transcendente dos arquétipos (Grof, 1997, p. 224, 225).

Os níveis da consciência

Diz Grof sobre a cartografia da consciência:

Tanto o nível sutil quanto o causal podem ser subdivididos em inferior e superior. O nível sutil inferior, ou astral-psíquico, contém tradicionalmente experiências fora do corpo, viagem astral, fenômenos psíquicos e ocultos (precognição, clarividência, psicocinese), auras e experiências similares. O nível sutil superior compreende formas arquetípicas de divindades, presenças supremas e guias espirituais, experiências de inspiração divina, visões de luz e iluminações auditivas.
O nível causal inferior é domínio do savikalpa samadhi, o Deus final, criador de todos os domínios, a luz audível do bija mantra - a fonte de todas as divindades individuais. O nível causal superior é caracterizado pela transcendência final e libertação na radiância ilimitada, ou nirvikalpa samadhi. Neste nível, não há sujeito ou objeto, nem self nem deus, apenas consciência sem forma. No nível do Absoluto, a consciência desperta para sua condição original e qualidade inerente que é também inerente a toda existência - densa, sutil e causal. (Grof, 1997, p. 56).

Grof apresentou, então, uma cartografia da consciência, com o nível sutil inferior (ou astral psíquico), o nível sutil superior, o nível causal inferior, o nível causal superior e o nível do Absoluto ou da Consciência Cósmica. É uma divisão de níveis semelhante à elaborada por Ken Wilber, como vimos no artigo anterior, ou mesmo à nossa divisão, que veremos num artigo futuro.

A identificação com outras pessoas

Na consciência transpessoal, podemos experimentar uma completa identificação com outras pessoas. A identificação pode significar conexão e implica assumir que todos os indivíduos compartilham de uma identidade universal. Nessa experiência podemos perder temporariamente nossa identidade individual.

Na identificação com os outros, podemos experimentar em nós a dor e o prazer, as emoções e sentimentos, os pensamentos e a memória de outras pessoas. Também podemos nos identificar com indivíduos ausentes, com nossos ancestrais, personagens históricos e nossos pais ou filhos. Porém, esse fenômeno é diferente da experiência de vida passada, pois nele não sentimos que fomos, de verdade, outras pessoas. E o fenômeno da identificação com diferentes pessoas pode ocorrer bastante com agentes paranormais (Grof, 1997, p. 62, 63).

A consciência grupal

Na experiência de consciência grupal há uma expansão de nossa consciência. Nossos limites são dissolvidos. Podemos sentir que nos tornamos todo um grupo nacional, político ou profissional. Podemos nos identificar com as vítimas de perseguição religiosa ou étnica. Os limites são progressivamente fundidos. E num nível mais avançado, podemos experimentar a identificação com a humanidade inteira (Grof, 1997, p. 64, 65).

A identificação com animais

É possível experimentar a identificação com outras espécies de animais. Podemos vivenciar em nós mesmo suas sensações fisiológicas, seus instintos e percepções. É possível experimentar as sensações de um gato irrequieto, por exemplo. E nessa identificação adquirimos muito conhecimento sobre os processos vitais dos animais (Grof, 1997, p. 66, 67).

As experiências ancestrais

Podemos nos identificar com nossos ancestrais e recapitular sua história. Nessa experiência, o conteúdo reflete a herança cultural do indivíduo. Por exemplo, um membro de um povo originário pode reviver no modo holotrópico de consciência, as atividades das aldeias de seus ancestrais. Nesse fenômeno, reproduzimos a expressão facial, as emoções e os padrões de pensamento dos nossos antepassados. Podemos ter vislumbres de antigas crenças, costumes e tradições (Grof, 1997, p. 89).

As experiências de vidas passadas

A experiência de vidas passadas guarda certa semelhança com as memórias ancestrais e coletivas. Porém, ela difere porque há uma convicção de lembrar-se de acontecimentos que ocorreram com a nossa individualidade. Há, então, um senso de identidade com nosso próprio ego.

Na experiência de vidas passadas conhecemos nosso carma. A lei do carma tem grande importância, segundo Grof. Essas lembranças cármicas podem envolver emoções positivas ou negativas e conexões destrutivas entre as pessoas. E uma das maneiras de se livrar do carma é trocar os papéis pessoais em outras vidas. Outra maneira de superar o carma é o tratamento de regressão a uma vida passada (Grof, 1997, p. 93-95).

As experiências espíritas

Nas experiências espíritas ocorrem contatos com espíritos desencarnados ou almas de pessoas que viveram na Terra. Esses contatos também podem ocorrer nas experiências de quase-morte (EQM). Alguns dos fenômenos espíritos são a psicografia, a xenoglossia, a pintura mediúnica e muitos outros. Na mediunidade, muitas vezes se dá a revelação de informações desconhecidas do médium e dos assistentes (Grof, 1997, p. 112-114).

A unidade com a matéria

Podemos também nos identificar com a água, o solo, as montanhas, as pedras preciosas, os minerais, as forças eletromagnéticas e outros fenômenos físicos. No modo holotrópico de consciência, é possível se identificar com qualquer objeto, pois não há separação sujeito-objeto (Grof, 1997, p. 75).

A unidade com toda a vida

Um dos fenômenos mais fascinantes da Psicologia Transpessoal é a identificação com toda a vida, desde a sua origem. Nessa experiência, sentimos os impulsos e instintos de todos os seres. Tomamos conhecimento de que a vida na terra é uma realização da consciência coletiva. Passamos a compreender as leis universais e entender os processos ecológicos (Grof, 1997, p. 74).

A identificação com o Planeta Terra

É possível nos identificarmos com o nosso planeta. Nessa experiência nos tornamos as rochas, os minerais e a biosfera. Nos identificamos com a Consciência Gaia, que é a consciência coletiva da Terra. Percebemos que a consciência está em todos os organismos vivos (Grof, 1997, p. 78, 79).

A identificação com o universo físico

Outro importante fenômeno da consciência transpessoal é a identificação com o universo. Nessa experiência, sentimos os processos universais dentro de nós mesmos. Segundo Grof, a Consciência Cósmica é composta pelas consciências individuais dos seres e possui um conhecimento absoluto da realidade (Grof, 1997, p. 80, 81).

A identificação com a Consciência Cósmica

O ponto máximo da experiência transpessoal é a identificação com a consciência cósmica. Ela é o substrato do mundo e o princípio supremo do universo. Ela é uma consciência sem forma e dotada de conhecimento infinito. Constitui uma rede unificada e uma entidade coletiva. Nela o ser parece dissolvido, mas com um senso de identidade separada (Grof, 1997, p. 99, 144-146).

A consciência cósmica é a nossa identidade universal, porém vamos sempre conservar a nossa identidade individual.


Referências

Grof, Stanislav. A Aventura da Autodescoberta. Tradução: Sonia Augusto. São Paulo: Summus, 1997.